Mateus 5:41: “Se alguém obrigar você a andar uma milha, vá
com ele duas.”
A Lei romana permitia que um soldado romano obrigasse a qualquer
cidadão do Império carregar uma carga ou bagagem por uma milha (1478 metros) ou
qualquer outro serviço que este determinasse.
Um exemplo da aplicação desta lei romana no Novo Testamento é a
exigência dos soldados romanos para que Simão carregasse a cruz de Jesus quando
ele caiu a caminho do Calvário
(Mc 15:21).
O contexto deste ensinamento de Jesus faz parte da série de contrastes
que Ele traça entre o seu ensino e os ensinos dos anciãos e rabinos e suas
interpretações e aplicações da Lei.
O trecho específico trata da questão da vingança e da não resistência
em casos de agressão, obrigação legal ou empréstimos.
A Lei não permitia que as pessoas aplicassem a vingança pessoal, mas
que deixassem que as autoridades infringissem as punições determinadas pela
Torá. Os escribas e fariseus, portanto, em sua interpretação e aplicação da Lei
abriram espaço para a retribuição e vingança pessoal.
Jesus não está anulando a Lei e nem a contradizendo, mas apresentando
um caminho melhor de cumprir a Lei. Ao invés da vingança e resistência aos
perversos, Jesus propõe o caminho da não violência, da superação da exigência e
do amor e da bondade prática.
Em síntese, Jesus estava dizendo: “faça o bem a quem te faz mal”, “faça
mais do que é obrigado a fazer” e “dê mais do que lhe é pedido”.
A segunda
milha proposta por Jesus surpreende nossos opositores, supera as
expectativas e expressa verdadeiro amor.
Você deve estar imaginando: “O que isto tem a ver com missões?”, “como
aplicamos o princípio da segunda milha em missão?”. Como podemos fazer além do
que é exigido e esperado em nossa atuação missionária para expressar
bondade e amor?
Acredito que no apóstolo Paulo temos um perfeito exemplo de um
missionário que aplicou de forma bem-sucedida o princípio da segunda milha
missionária. Quando Paulo em sua Segunda Viagem Missionária decide levar
Timóteo consigo, ele o convence a se circuncidar (At 16:1-2) devido à interação e convivência que teria com os judeus em suas viagens.
Timóteo era filho de mãe judia e pai grego. Para os judeus ele seria
considerado um autêntico judeu, caso fosse circuncidado. Porém, se Timóteo
continuasse vivendo e atuando em ambientes cristãos e pagãos, não teria a
necessidade de se circuncidar. Se ele não quisesse assumir esta identidade
étnica, cultural e religiosa de “judeu”, poderia continuar incircunciso.
Espiritualmente falando, sua salvação e ministério não dependia disto.
A questão então é: por que então ele aceita se circuncidar? Uma cirurgia que o
deixaria marcado no corpo por toda a vida? E que o deixaria com dores por 3
dias? Por que ele fez, se não precisava?
Resposta: Pela missão! Circuncidado, Timóteo teria acesso a
ambientes judaicos e poderia pregar livremente. Teria credibilidade para
mostrar Jesus como o Messias profetizado na Torá. Para Timóteo a missão era
mais importante do que sua razão, seus direitos ou conforto.
Paulo nos dá outro exemplo quando retornando a Jerusalém, ele ouve de
Tiago que sua fama era de alguém que é contra a Lei de Moisés, contra a
circuncisão e os costumes da Lei (At 21:20-21). Tiago persuade Paulo a guardar
um voto onde ele rasparia a cabeça, se purificaria e se exporia publicamente no
Templo para que os judeus que o vissem soubessem que os boatos sobre ele eram mentirosos
(At 21:23-24).
Paulo não somente aceita a
proposta e toma o voto, ele até paga os custos para que quatro homens raspassem
suas cabeças e tomassem o mesmo voto. Por quê? Este era o plano conciliador de
Tiago, não dele! Plano este que nem deu certo! Por que Paulo aceitou fazer algo
que ele não precisava para desmentir boatos que eram mentirosos? Que lhe custou
dinheiro e até talvez a sua reputação?
Pela Missão! Por amor a Cristo e amor ao próximo. Porque Ele
amava aqueles que Deus ama e decidiu em sua Missão não ser pedra de tropeço
para ninguém e ser tudo para todos visando ganhar alguns (1Co
9:19-23).
A Segunda Milha Missionária para Timóteo e para Paulo construiu pontes
de ligação ao invés de erigir muros de separação. Também serviu para
identificá-los com Cristo no autoesvaziamento, sacrifício e também na sensação
de realização ao cumprir sua missão dada por Cristo (2Tm 4:6-8).
E para nós hoje? Qual tem sido a nossa Segunda Milha Missionária?
O que
ela pode nos ajudar a realizar em prol da Missão que Cristo nos entregou?
Acredito que dependendo do contexto cultural e do tipo de missão que somos
chamados a realizar, a segunda milha missionária pode assumir contornos e
conteúdos diferentes.
Em 2018, uma equipe de nossa congregação foi até Moçambique para servir
numa missão de curta duração com uma agência missionária interdenominacional.
Embora a língua, o clima do país fossem semelhantes, a cultura e os costumes eram
muito diferentes.
Tivemos que adotar o princípio da Segunda Milha para expressar respeito
e empatia pela cultura local e construir pontes e conquistar o direito de
sermos ouvidos. Não foi fácil!
Nossas irmãs tiveram de vestir capulanas quentes num clima
ensolarado típico da África. Além do desconforto para andar e o calor, havia a
preocupação de lembrar de vestir a indumentária.
Os homens tinham que sempre estar vestidos de calça cumprida no mesmo
sol causticante e também de resistir a tentação de criticar e determinar como
se fazer o trabalho da forma como costumamos fazer em nosso país.
O que conquistamos, missionariamente falando, por aplicar a Segunda
Milha em Moçambique? Conseguimos falar de Cristo em algumas igrejas e
localidades sem igrejas e fomos convidados para irmos em outras que souberam de
nossa presença e do trabalho que realizávamos.
Conseguimos lidar com diferenças de língua, cultura e etnia para
trabalharmos em parceria com missionários e obreiros locais que dedicam suas
vidas a Missão e que muito nos ensinaram sobre a obra missionária em contextos
diferentes do nosso.
Qual tem sido a sua Segunda Milha? O que a Missão está te chamando para
fazer ou deixar de fazer?
Que sacrifícios ou perdas a Segunda Milha Missionária tem exigido de
você e da sua congregação?
Quem a Segunda milha missionária tem te chamado para se tornar com o
fim de ganhar pessoas para Cristo?
Caminhando a segunda milha eu estarei sempre caminhando como Jesus,
caminhando com Jesus e caminhando para Jesus.
Joncilei Mendes